segunda-feira, 20 de outubro de 2014

#19 - O MEU LÁPIS, Teresa Guedes

É impossível pintar
a canção do vento
ou o choro das árvores
quando são abatidas.
É possível, diz o meu lápis
habituado a tantas vidas.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

#18 - AS ETERNAS MARGENS, Ana Luísa Amaral

   À Margarida Losa

Um cedro te pensava.
Nunca faia,
ou sobretudo junco de ternura.
Mas de cedro: sempre sementes foram
a dar seiva aos amigos
e ao mundo.

Um cedro te pensava. Feito de força
e vento
-- ou vendaval.
Nunca faia de espanto
ou junco horizontal
onde horizonte: nada.

Um cedro. Uma pequena ponte alada,
força feita de tanto
e luz de solidez, onde a seiva
se faz de frente ao mundo,
a ela se ligando
a tua imagem.

Um cedro te pensava.
Se faia fores também,
ou frágil junco,
igual o coração.
E a sua eterna margem.

#17 - PAZ, Teresa Guedes

Quem se zangou com as oliveiras?
Porque as abanam tanto?
Pronto, já caíram as azeitonas.
As pessoas apanham-nas como jóias.
Mas uma ficou esquecida:
na árvore, exausta e feliz,
ela adormece suavemente.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

#16 - A ÁRVORE DA SOMBRA, Rosa Alice Branco

A árvore da sombra
tem as folhas nuas
como a própria árvore ao meio-dia
quando se finca à terra
e espera
como um cão espera o regresso do dono.
Nós abrigamo-nos mais tarde
ou mesmo agora num lugar
muito distante
onde o tempo recorta
um tapete que esvoaça no papel.
A casa da sombra
é branca e habitada.
Somos nós ainda
sentados ao fogo que o teu sorriso
acende e aconchega
no silêncio que ilumina
a árvore da sombra
para que a noite desenhe
o seu nome visível
e a sombra possa contemplar
os ramos mais belos e o tronco mais esguio
do seu objecto.
Nesta sombra há um imenso amor
ao meio-dia.
A hora dos prodígios
é feita de segundos do tempo que há-de vir
e o horizonte
é a proximidade total da tua boca